sábado, 15 de outubro de 2011

Espectro na janela

O ranger dos dentes,
das portas, das almas
à noite se adensam.
Erguem-se os olhos
ao vazio
e o reflexo na janela
surpreendem.
Espectro de ontem,
apenas vigia.
Não se abala.
Ilusão, menos carne,
mas igualmente ilusão.
Imóvel, prova-me
sua inexistência
com minha solidão.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Árvore à beira de estrada

Com sorte, uma singela palavra
desenhará no chão
a sombra vaga
da estranha lágrima
que se abeira ao cílio
qual reação oftálmica
à luz do ocaso
moribunda e, ainda assim,
resplandecente
sobre os troncos curvados
da árvore envelhecida
à beira da estrada
à espera tardia
da minha passagem fugaz,
quilometro 35,
caminho repetido,
caminho esquecido,
com a árvore,
a luz, a lágrima
e o ocaso...

sábado, 27 de agosto de 2011

Os olhos (que imagino) de Pedro Damián

As chagas na pele fina
da alma machucada e maculada
logo cicatrizam.
Não são nem dor
são lembranças
(quase nostalgia da dor)
São a ameaça perene
ao homem sereno
à espera da sua segunda vida,
prometida nos olhos tristes
de Pedro Damián.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Passos sobre Gólgota

Como podem ser os passos tão lentos
quando o caminho é tão certo?
É único, um plano sobre Gólgota,
e o norte está em todos os lados
Os olhos resvalam equânimes
sobre rostos idênticos, parecidos
ou em todo caso indiferentes,
É o mesmo...

Uma sorte de brisa sopra despretensiosa
e o rosto se parte e arde,
quisera ver o pôr-do-sol
e nele entender a verdade dos poetas
o sol se põe e o verso perdi....
Resta a noite sem estrelas, insone
e névoa alaranjada.

Retorno ao lar, rasgando o véu espesso
do ar sujo de respirações cansadas,
procurando a ponta do anel dos monótonos.

O lar mal acolhe, recolhe um mundo
de tristeza sem fundamento,
quase inaceitável, mas camas e lençóis
corrompem e convencem...
Envelhecer é deitar-se...
Envelhecer-se é deitar...